Governo
quer punição a motorista que beber mesmo sem teste do bafômetro.
Especialistas defendem que mudanças na legislação também aumentem
pena para casos de homicídio culposo - em que não há intenção de
matar
As
alterações propostas na Lei Seca podem aumentar o número de
motoristas processados pelo crime de dirigir embriagados. Porém,
para especialistas em direito criminal ouvidos pelo site de VEJA, a
sensação de impunidade só acabará quando a punição para quem
mata ao assumir o volante alcoolizado for mais dura.
As
alterações no texto da lei, defendidas nesta terça-feira pelo
governo, dobram o valor das multas e eliminam o limite mínimo de
álcool no sangue para caracterizar crime de trânsito. "São
mudanças positivas. Mas enquanto não aumentarem a pena para o crime
de homicídio culposo (em que não há intenção de matar) ao
volante quando o motorista bebe, a sensação de impunidade vai
continuar", afirmou o jurista Luiz Flávio Gomes.
No ano
passado, vários casos de vítimas de acidentes que envolviam
motoristas alcoolizados esquentaram a discussão sobre se a pessoa
que bebe e dirige assume o risco de matar. O tema chegou ao Supremo
Tribunal Federal (STF) e o ministro Luiz Fux decidiu que o condutor
embriagado não deve responder por homicídio com dolo eventual
(quando assume o risco de matar).
A decisão
de Fux foi tomada no julgamento de um caso isolado. O plenário do
Supremo, que reúne todos os ministros, ainda não bateu o martelo
sobre a controvérsia. Nos casos de homicídio culposo, o Código de
Trânsito Brasileiro determina uma pena de dois a quatro anos – que
geralmente é convertida em penas alternativas, como prestação de
serviços à comunidade.
Projeto
- O presidente da Comissão de Sistema Viário e Trânsito da
Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), Maurício
Januzzi, também defende que as mudanças na Lei Seca incluam a
questão da pena para homicídio culposo ao volante.
Junto com
ONGs lideradas por familiares de vítimas de trânsito, Januzzi
elaborou um projeto de lei de iniciativa popular que prevê uma nova
tipificação de crime entre o dolo eventual e o culposo (chamada
tecnicamente de preterdolo) para quem causa acidentes depois de
beber. Nesse caso, o motorista assumiria o risco ao beber e dirigir e
a culpa da consequência – o acidente. A pena proposta é de cinco
a oito anos de prisão.
Mesmo sem
mudar a pena para os homicídios, o promotor de Justiça Tomás
Ramadan acredita que as mudanças na lei favorecem a defesa da tese
de dolo eventual nos casos de mortes causadas por motoristas
embriagados. "Sem o limite, beber e dirigir passa a ser crime,
independentemente da quantidade de álcool ingerida. Se ainda assim o
motorista assumir essa conduta, isso ajuda a caracterizar que ele
sabia do risco de acidente", afirma.
Rigor
- Se aprovado o substitutivo que tramita atualmente na Câmara
dos Deputados para mudar a Lei Seca, quem for flagrado dirigindo com
qualquer concentração de álcool no sangue poderá responder pelo
crime de dirigir embriagado. Hoje, as autoridades precisam comprovar
que o motorista ultrapassou o limite de seis decigramas por litro.
Com as
adequações propostas, a autoridade policial poderá lavrar um termo
que constata a embriaguez mesmo se o motorista se recusar a soprar o
bafômetro. Além disso, poderá contar com um conjunto maior de
provas - passarão a valer depoimentos de testemunhas, imagens e
vídeos. A proposta também dobra o valor da multa administrativa,
que poderá passar dos atuais 957,65 reais para 1.915,30 reais. A
pena para quem dirige sob efeito do álcool é de detenção de seis
meses a três anos, multa e suspensão ou proibição do direito de
dirigir.
O
deputado federal Hugo Leal (PSC-RJ), autor da proposta em discussão
juntamente com o Ministério da Justiça, não acha que as mudanças
sejam um endurecimento na lei. "Quem não deve não teme",
diz.
"Se
o motorista achar que o policial vai lavrar o termo somente para
prejudicá-lo, é só fazer o teste", diz o deputado. Outra
opção para o motorista que estiver sóbrio e não quiser fazer o
bafômetro será o teste de embriaguez, semelhante ao procedimento
adotado nos Estados Unidos, no qual o condutor anda sobre uma linha
reta, por exemplo. Desde 2009, os motoristas que se recusam a fazer o
bafômetro na cidade de São Paulo são encaminhados para exame
clínico no Instituto Médico Legal (IML), onde os médicos emitem
laudos técnicos constatando a embriaguez ou não do condutor.